Pensata em Abu Dhabi
Postado em 28 Jan 2015 04 04 Textos Anteriores











JM  (à direita) e José Ramos
Coelho no aeroporto de Abu Dhabi:
em busca da
 viagem interior 


por JOMAR MORAIS


No princípio, aprendemos a viajar por instinto de sobrevivência. Nômades, buscávamos alimento e um mínimo de segurança. Viajar nessa época, penso, era quase sempre sinônimo de sacrifício e ansiedade. 

Depois, a descoberta da agricultura nos fixou à terra e nos  trouxe a alegria do aconchego e dos momentos de ócio e também o apego e a ambição. Quem sabe, tenha surgido aí a viagem de negócio, impulsionada pelo prazer da troca e a sensação de novos ganhos.

Só mais tarde, os bem sucedidos e privilegiados de uma organização social já discriminatória inventariam a viagem de lazer: o prazer de descobrir novas paisagens e relaxar. No século passado, com a revolução nos meios de transporte, a explosão tecnológica  e os passos tímidos em direção à inclusão social, o turismo  se institucionalizou e virou ferramenta de integração e de desenvolvimento.

Mas...

Como tudo na vida, o turismo tem seu outro lado, feito de distorções como a exploração sexual e a corrupção da virtude original do prazer de viajar, transformado  em  mais uma faceta da compulsão por consumo.

Sobraram, como escape, as viagens de aventuras (até estas, às vezes, pasteurizadas) e os mochileiros que, como eu, tentam resgatar o prazer da descoberta do mundo livre de esquemas comerciais que impedem a surpresa e a criatividade. 

Não existe a fórmula do mochilão perfeito. Isso seria engessar a inteligência e a emoção. Cada mochileiro faz o seu caminho. 

O meu, por exemplo, é o da aventura rústica, solitária, contemplativa, sem a neura do relógio, 100% no stress. Não que eu não curta as barulhentas viagens em família, agora ainda mais ruidosas pela presença de meus netos, mas não abro mão de um périplo à deriva que, em mim, costuma turbinar uma viagem paralela, imaterial e introspectiva, veículo de descobertas em mim mesmo.

Este ano quebrei uma “regra” e tenho comigo a companhia agradável do amigo, filósofo e escritor José Ramos Coelho, companheiro de meditações no Sapiens e arauto de propostas alternativas de vida saudável e rica de significados. 

No rumo do Nepal e da Índia, chegamos aos Emirados Árabes Unidos, na Península Arábica, sem manchar o perfil de um mochilão de hábitos frugais, muitas andanças e abertura para o novo. Sentado no lounge do majestoso aeroporto de Abu Dhabi, escrevo este texto enquanto se passam as 18 horas de espera pelo voo que nos levará a Katmandu.

Lá fora, a maior das sete cidades dessa confederação de antigas monarquias árabes exibe a pujança de um pequeno país trilionário (sexto produtor de petróleo) e suas contradições: renda per capita de 54 mil dólares versus trabalho de estrangeiros às vezes em condições de semiescravidão, segundo a ONU. Liberalidade nos costumes incomum no mundo islâmico versus ausência do voto universal.

Certamente voltarei um dia para conhecer de verdade esse país surpreendente, mas agora o que busco é a proximidade dos himalaias para a viagem maior da meditação.

[ Publicado na edição do Novo Jornal de 27/01/15 ]

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