Quem manda, de fato, no Estado
Postado em 30 Apr 2017 20 08 Textos Anteriores










O estado é uma entidade pública, mas  
há séculos serve, prioritariamente, aos  
interesses privados que o governam  


por JOMAR MORAIS


A bola da vez chama-se Odebrecht, uma das maiores empresas de engenharia e construção do mundo, uma das maiores multinacionais brasileiras. As delações dos operadores de seu Caixa 2 à Justiça provocam terremotos políticos no Brasil e em outros países. A eficiência e o gigantismo da Odebrecht, dizem os relatos, têm uma de suas bases de apoio na corrupção.

Além de erguer grandes estruturas, a empresa tornou-se imbatível na arte de comprar políticos, burocratas, financiamentos oficiais, pareceres ilegais e até apoio popular. Com dinheiro sujo elege parlamentares, coopta presidentes da República e, provavelmente, membros do poder do Judiciário, cala a mídia... enfim manda e desmanda no estado brasileiro, subjugado, como a maioria dos estados contemporâneos, ao poder econômico e à ação corporativista.

O nome Odebrechet surge na sequência de escândalos que sacodem, nos últimos tempos, o governo federal, o governo de São Paulo e os de outras unidades federativas, e  em trilhas também percorridas por outros gigantes da construção, multinacionais européias e, claro, bancos. No rastro dessas lideranças da trapaça, segue uma legião de médias e pequenas empresas, agentes públicos e privados e políticos de todos os partidos.

O impacto desse noticiário sobre as pessoas é enorme e tem efeito catártico. Indignação, clamor por justiça e, na ausência de dados precisos ou da incapacidade de compreender e analisar os fatos, também imaginação, muita imaginação. Soluções fantasiosas são propostas e até as viúvas da ditadura militar ressurgem pregando “intervenção constitucional”.

Sobre os políticos e os partidos, o choque é grande, mas, nesse caso, a arte de embaralhar a verdade é o recurso de sempre para evitar o naufrágio. As delações atingem todos, mas no limiar de uma campanha eleitoral, a esperteza diz que é melhor realçar a culpa do adversário, com uma ajudinha da mídia partidarizada.

Enquanto escuto a balbúrdia, reflito sobre a dificuldade que temos em enxergar o óbvio e lamento pelo povo, a grande massa desinformada, levada a espasmos ciclotímicos que servem à astúcia dos manipuladores. Há vilões aos milhares nessa história de assalto ao bem comum, mas reduzir a corrupção endêmica à ação de algumas pessoas – os adversários políticos, por exemplo – é perder de vista a gravidade do problema e perder-se na armadilha das emoções instrumentalizadas.

Estamos diante de um tumor institucional, um estado assaltado por interesses privados, loteado por máfias incontáveis que disputam o butim da coisa pública em todos os níveis de poder e administração. Os políticos corruptos, os partidos prostituídos e as campanhas financiadas com dinheiro sujo são apenas a ponta de um iceberg gigantesco de iniquidades e imoralidades sustentado por valores cultivados no cotidiano das pessoas, das famílias e dos pequenos grupos.

Não é exagero dizer: não há governo corrupto em uma sociedade honesta. Isso dói, mas, sem encarar a realidade, continuaremos todos condenados à indignação estéril ante escândalos sem fim.

[ Publicado na edição do Novo Jornal de 25/04/17 ]

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