Uma chance rara
Postado em 23 Jun 2016 02 05 Textos Anteriores













A crise política não é o fim do mundo, mas uma  
chance rara de passar o Brasil a limpo. Que caiam  
as máscaras e se reconstruam as instituições  



por JOMAR MORAIS


Alguém pode achar que vivemos a véspera do fim do mundo, mas, para mim, a crise política atual dá ao Brasil uma chance rara. É preciso que os tumores estourem para que, enfim, tenhamos consciência do quanto estamos enfermos como sociedade e nação.

Um presidente ilegítimo, cercado de ministros corruptos e ele próprio acusado de receber propina, é apenas o sintoma mais visível de nossa infecção generalizada. 

Um réu em processos de corrupção, como o deputado Eduardo Cunha, deflagrando o impeachment de uma presidenta até agora não incriminada pela Polícia Federal, Ministério Público ou Justiça, com a ajuda de um Parlamento onde mais da metade dos membros é réu ou citado em processos de corrupção e com a anuência do STF - que atendeu ao pedido de afastamento de Cunha, feito pelo procurador geral Rodrigo Janot cinco meses antes, só depois que o deputado repassou ao Senado a autorização para o prosseguimento da farsa – é apenas um indicativo de que nossas instituições apodreceram.

As apurações e delações que revelam o mar de lama envolvendo praticamente todos os partidos e grandes grupos empresariais, em ondas de subornos materializados com a participação de agentes públicos, são apenas a prova de que o poder e as leis foram formatados para o tráfico de influências e o benefício de poucos.

A derrocada moral do PT, único partido popular que chegou ao poder na história do país, ao privilegiar acordos espúrios para acalmar os lobos da política e da plutocracia, é apenas a evidência de que nenhuma reserva moral fica incólume quando submete seus princípios à ilusão de que os fins sempre justificam os meios. 

A manipulação de informações pela grande mídia, que se comportou como arauto da oposição na articulação golpista ainda em curso, é apenas a demonstração de que somos vulneráveis à mentira.

Sim, precisamos dessa crise para passar o país a limpo. Precisamos da continuidade das investigações, prisões e delações – sem seletividade ou privilégios – para que a verdade apareça e a justiça se faça nos três poderes da República.

Precisamos de voto, eleição já, para impedir que salteadores dirijam o país em favor de seus interesses e os dos grupos poderosos que os submetem via suborno. Precisamos de Constituinte e reforma política radical, que desmonte o poder dos banqueiros e empresários sobre os partidos e sobre a burocracia estatal. Mas, sobretudo, precisamos aproveitar a chance rara dessa crise para nos repensarmos como indivíduos, sociedade e nação.

Existiriam políticos corruptos e golpistas numa sociedade honesta e solidária? Certamente que não. Os políticos que temos não chegaram até nós em discos voadores. Eles emergiram, com o nosso voto, a partir de nossas comunidades e, lá em cima, expressam valores semelhantes aqueles que nos guiam no dia a dia. O Congresso espelha uma sociedade que, nas relações corriqueiras, pratica a esperteza, o golpismo e a corrupção.

Sem autocrítica e sem um intenso programa de educação moral, com a revisão de valores, qualquer reforma política acabará sabotada pelas vis intenções dos indivíduos.

[ Publicado na edição do Novo Jornal de 21/06/16 ]


Acesse, na página de Início do site, a programação comemorativa
pelos 15 anos de atividades do Sapiens

Para abrir a janela de comentarios, clique sobre o titulo do texto ou sobre o link de um comentario >>:
Para abrir a janela de comentarios, clique sobre o titulo do texto ou sobre o link de um comentario

Deixe um comentario
Seu nome
Comentarios
Digite o codigo colorido